sábado, agosto 16, 2008

Sonhamentos

Durante o dia sou capaz de controlar os pensamentos que tentam emergir na minha consciência. Escolho-os a dedo ou a juízo. Relego os complicados e não resolvidos para o mais profundo do meu ser. Reprimo-os e escondo-os para não sobrecarregar as minhas ideias e não complicar o eu já complicado. Durante o dia sei tudo o que me assoma o cérebro.

De noite perco essa capacidade. E perco-a de tal modo que a consigo inverter. De noite todos os meus sonhamentos são a imagem de tudo o que neguei quando estava acordado. Neles vivo o que gostaria de viver de dia mas que não consigo porque há assuntos complicados que não o deixam acontecer. Neles sinto o que já senti e deixei de sentir e que tenho saudades de sentir de novo. Parece tudo tão real, tudo tão como eu desejo. Mas são sonhos. Não existem. Não existem por serem tão bons. Não existem por serem tão grosseiramente irreais. Ah se eu pudesse vivê-los... Quero estes sonhos que tive, em que tudo é tão resolúvel e tão simples e tão directo e tão prático. E tão bom. Quero-os com tanta força que dói não os ter e dói querê-los.

É por isto que eu não gosto de dormir. Por não conseguir controlar os meus sonhamentos. Por eles me mostrarem aquilo que não quero enfrentar. Por eles me mostrarem aquilo que não posso ter. Por serem mentiras.

Morto

Faz tempo que morreste. Mas, mesmo assim, guardo-te passados tantos meses. Estás escondido e protegido num qualquer canto da minha existência e lá descansas tal qual como quando faleceste. Estás igual. Não apodreces. Como que agarrado a um fio de esperança que eu já não vislumbro. À espera que talvez a ciência invente uma fórmula que te permita trazer de novo à vida.

Tenho dúvidas se esperarás tanto tempo por isso. Mesmo que esperes e voltes a viver, não sei até que ponto o teu caminho voltará a ser o do passado. O mundo lá fora não pára enquanto estamos além da realidade e demasiadas coisas acontecem enquanto nada podemos fazer. Terás pernas para voltar a andar? Terás olhos para voltar a ver? Terás mãos para voltar a agarrar? Terás coração para voltar a sentir? Por vezes tenho a certeza que não. Outras tenho vontade que sim. No meio disto tudo, sinceramente, já não sei...