segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Boneco de neve

Um boneco de neve é feito daquela coisa branca e fofa que costuma cair do céu... Como é que se chama mesmo? É isso! Neve!
Um boneco de neve é feito de neve que costuma cair quando o tempo está agreste e as nuvens pretas lá de cima choram lágrimas que gelam pelo caminho antes de chegarem a uma qualquer superfície onde possam repousar. Com as mãos protegidas por luvas, é normal fazerem-se duas bolas enormes, uma por cima da outra, simulando um corpo e uma cabeça. Dos lados do corpo, colocam-se dois galhos fracos como muitas das fraquezas que se têm quando as coisas não correm bem, mas com força para abraçarem tudo o que quiserem. À frente, ainda no corpo, vêm-se 2/3 botões que fecham um casaco que não se vê, invisível como o sofrimento que só uma atenção especial descobre. Ao pescoço, um cachecol quente como que a representar o sufoco que muitas dificuldades causam constantemente e às quais pode apetecer sucumbir. Na cabeça, a tradicional cenoura ocupa o lugar de todas as mentiras que se acumulam com o arrastar do relógio, num crescendo infindável. Os olhos, duas pedras, podem servir para serem arremessados contra um qualquer vidro onde eles próprios se vêem, só para negar esse sentido às vezes demasiado revelador. No topo, um gorro a proteger do frio que muitas vezes a solidão cria na mente e que se estende a todo o restante organismo.
E depois surge aquele dia feliz e alegre de sol. Aquele reconfortante calor. E o que acontece ao boneco de neve? Derrete! E para que serve agora? Para nada. Agora é uma enorme poça de água que se mistura com a terra onde estava assente para formar um insignificante monte de lama. Os galhos rebentam e criam árvores fortes a cujo topo quase ninguém chega. Os botões do casaco tornam-se órfãos do ser que os sustentava. O cachecol é já supérfluo para qualquer ocasião. A cenoura mirrou como se fosse possível esquecer todas as verdades que não se contaram. As pedras rolaram sobre si e perderam-se no chão de onde vieram. O gorro é recolhido numa gaveta com cuidado, para que, num outro momento de solidão, num dia frio de tempestade, possa vir a aquecer a cabeça do velho e usado boneco de neve. Do sempre eterno boneco de neve.

1 comentário:

mag disse...

ahm.. perfeita imagem. uma ideia muito lúcida de um boneco de neve encantador =) *