quinta-feira, dezembro 27, 2007

Decorem

Decorem isto: ter um conceito completamente diferente de música não é sinónimo (em lado algum do mundo e para qualquer pessoa com um mínimo de racionalidade) de se ter uma cultura musical diminuta ou limitada.

segunda-feira, dezembro 24, 2007

Um pedaço de texto

Não sou difícil de agradar no que diz respeito a presentes. É verdade que sou muito refilão e quase nada está bem para mim. Apesar disso, acho que aprecio de tudo um pouco e falhar com os meus gostos é um acto quase impossível.
No entanto, há algo a que eu dou imenso valor: um pedaço de texto. Acho que todas as prendas, acompanhadas de um papel escrito com algo sincero e que se adeque à situação, ganham um interesse muito maior. Tornam-se mais pessoais. E únicas.

Primeira escolha

Desculpem, mas não fui feito para ser segunda escolha... Se me querem, sou primeiro. Se não sou primeiro, é porque não me querem. Não tenho feitio para andar a substituir pessoas que os outros preferem para as mais diversas situações e actividades.

sábado, dezembro 22, 2007

Troca

Gostei do abraço que me deste. Gostei de perceber porque o deste. Do pouco que de ti conheço não há espaço para fingimentos. E aquele teu gesto tão simples e tão espontâneo teve que ser verdadeiro. Verdadeiro e cheio de coisas que disseste sem as dizer.
Sei o que sentes. Também já o senti. E o caminho às vezes é mais fácil do que o que parece. Às vezes a culpa não é só nossa. Às vezes a culpa não é de todo nossa. Acredita nisso. E em ti.

sexta-feira, dezembro 21, 2007

Piadinhas

O jogo das cadeiras só tem piada enquanto, no início, todos estão a dançar ao som da música e enquanto esta não pára e algum jogador é eliminado.

Se querem fazer brincadeiras ou piadas, que as façam para que todos percebam e participem. Private jokes são somente para quem as percebe. Por isso, que se digam no círculo privilegiado que as compreende. Para os inteligentes que se divertem com elas. Assim evita-se a impressão de estar sempre alguém excluído e a olhar para o tecto. À espera que a próxima conversa possa ser minimamente abrangente para também o incluir.

Definições III

Dia de Ano Novo: mais uma das imensas festas criadas pelas grandes cabeças do consumo para que o belo povo português (tão parco em sentido crítico e pensamento próprio) possa gastar à parvalhona o dinheiro que nunca tem e embebedar-se sem razão coerente alguma.

quarta-feira, dezembro 19, 2007

Merda para isso

O que é que eu preciso dizer ou fazer para que os outros percebam que eu também tenho problemas? Que eu não sou só aquele indivíduo que diz parvoíces, que anda com um sorriso quase sempre na cara e que está sempre a refilar de tudo? Será que tenho que escrevê-lo na testa ou usar uma placa ao pescoço com esse "pormenor"? Será que as minhas olheiras e a minha tristeza mal contida não chegam? Será que tenho que gritar por um pouco de apoio? Será que estou a pedir algo que transcende as pessoas à minha volta?

Se só me ajudam quando peço..., então merda para isso. As coisas só têm valor quando dadas de livre e boa vontade.

Malucos mas não tanto...

"Só tenho duas certezas na vida: a morte e os impostos."

Por vezes os doentes psiquiátricos também têm algumas coisas muito inteligentes para dizer...

segunda-feira, dezembro 10, 2007

Associação

Sopra. Um castelo de cartas que cai. Não aguenta. Um ás que voa. Um ás que não é da mesa e que sucumbe ao duque de trunfo. Um acaso. O ocaso da luz do jogo. A escuridão preta do fecho da diversão.

Silêncio. Quietude. Pureza. Caos!

Confusão extrema e simples. Trocas. Enganos. Anos de enganos. Tropeções e cambalhotas. Dor. Falta de jeito e hematomas. Sangue seco. Como a pólvora. Só fogo de vista. Ameaças sem concretização.

Palavras. Ideias. Vontades. Zero!

Nada. Submerge bem fundo no mar. Afoga-se. Falta o ar no meio do fogo que arde à superfície. Extingue-se. Roxo, azul, verde. Feio. Decrépito. Inconsequente. Parado como gelo de anos de emoções.

Solidariedade. Entrega. Preocupação. Mentira!

Gosto de ti. Quando me apetece. Agora não. Ontem? Não há amanhã depois de hoje. O tempo cessa. Cessa a chuva a meio caminho. Não se completa. Engana. Mas molha. Molhos de lágrimas. Secas e gastas.

Esperança. Crença. Alegria. Mortas!

Cruzes. Tesouros perdidos. Achados e roubados depois. Pois. Sem o que quer que seja. Despojado. Descapacitado. Desalentado. Sem força. Ido. Tremido e caído. Não dá mais para o peditório. Falido.

Dinheiro. Oportunidades. Relações. Utopias!

Imaginação. Fértil. Estrumada. De merda. Chão que já deu uvas. Vinho. Bebedeiras de sono. Esquecimento voluntário. Não querias? Recordação que já foi. Que nunca foi. Lógico que não será. O quê? Não interessa.

Estou triste.

sábado, dezembro 08, 2007

En guarde

Touché dizes-me tu. Pronto! Tudo bem... Podes parar. Já percebi que perdi. Já o aceitei. Desisto.

quinta-feira, novembro 29, 2007

Fiel

Não tenho sempre razão. Felizmente. Mas tenho quase sempre razão. Infelizmente. Porque é que os meus instintos são tão cruelmente verdadeiros? Porque é que eu consigo ver o que existe e não está à mostra? Porque é que me tentam demonstrar o contrário? Porque é que eu hesito em acreditar nessas ilusões hipócritas? Está lá, é claro, é óbvio, é puro. Não pode enganar. A mim não me engana. Quase nunca. Sinto-o. Não sei explicar como. Mas sinto-o. Com a cabeça, os olhos, o coração e as mãos. E acho que é nisso que tenho que me fiar. Em mim próprio. É com isso que tenho que me preocupar. Em ser fiel a mim próprio.

Reciprocidade

As balanças nunca são equilibradas. Por mais que custe. Há sempre um prato que pende e pesa mais que outro. Não há massas suficientes para evitar o desnivelamento... São daquelas coisas pré-determinadas. No corpo de cada um. Nos seus órgãos. Nas suas células. Nos seus cromossomas. Nos seus genes. Nas suas merdas de feitios.
As suas dores são sempre maiores que as dos outros. Sangram sempre mais. Saram muito mais devagar. Os problemas dos outros não existem. Até podem existir... mas não interessam. Pelo menos tanto. Os outros são sempre muito mais fortes. São fortes para eles e para os que estão fracos. Os fortes nunca se fartam de o ser. Os fracos fartam-se sempre de o ser.
Reciprocidade é algo unidireccional... E centrípeto. "A mim". O outro lado é que falha, constantemente, mesmo quando acerta e esse acerto supera todas as expectativas. Quando é inesperado. Mas isso não vale. O que vale é usar e deitar fora. E substituir por outro. Degraus de escada que se pisam e se deixam para trás. Sujos.
A pequenês de visão é mais ofuscante que o sol dentro do olho. Burros de palas com mente afunilada. Burros de espírito. Burros de reconhecimento. De um obrigado, mesmo que por outras palavras.

quarta-feira, novembro 28, 2007

Definições II

Amigo: pessoa pertencente a um determinado período (mais ou menos curto) da vida de um indivíduo e que lhe transmite/dá necessariamente algo de positivo ou de proveitoso. Posteriormente, após a cessação desta cedência, será completamente descartado da vida desse mesmo indivíduo, podendo ser banalmente esquecido ou, na maioria das vezes, guardado como memória.

segunda-feira, novembro 26, 2007

Casas

As nossas casas são os refúgios onde parte de nós cresceu. A bem ou a mal. E, para o bem ou para o mal, estaremos sempre a elas ligados...
Houve quem ousasse destruir-me uma casa. Mesmo que fortuitamente. Depois de tanto tempo e apesar de estar já tão longe, ainda me senti atingido e cravejado por estilhaços que de lá voaram. Angustia-me ainda aquele buraco demasiado profundo para a minha vista e para a minha memória. Aquele buraco não pertence ali. Aquele buraco não existia ali. Não existia quando eu lá existi. E, se assim é, não pode ser real. Aquele buraco não é real na minha realidade da minha casa.
Lembro-me de todos os cantos, mesmo com os olhos fechados. Sei as brincadeiras que lá tive e as horas infindáveis com as quais me deliciava. Recordo-me das pessoas que por lá passaram e de tudo o que representaram ou ainda representam no meu eu.
A varanda com o armário dos brinquedos e as tartarugas em cima das máquinas. A cozinha com os canos rotos e cheia com a mesa enorme onde peregrinamente se estudava. O hall com o tapete de Arraiolos, tabuleiro dos mais diversos jogos. A sala, encabeçada pelo piano que se ouvia à distância, onde festejei um golo de um egípcio vermelho que só adiou o riso verde. O escritório onde reinava o computador, a aparelhagem e as imensas horas lá passadas. O corredor, campo de futebol que até a fracturas múltiplas teve direito. Os quartos onde começava o refúgio e onde acabava o sossego. O mítico empedrado inclinado, local de concentração, onde o suor corria a bicas, por vezes até altas horas, e que nunca mais foi o mesmo.
Aprendi muito ali. Muito sobre muitas coisas. Saí quando senti que deveria sair, apesar de lá ter sempre ficado. As saudades das mesmas rotinas repetidas... Nós somos todos os pedaços que deixamos pelo nosso caminho, nas mais diversas situações e lugares. Somos o que vivemos, onde vivemos e com quem vivemos. Mesmo à distância temporal e espacial, os nossos pedaços ainda nos marcam e doem quando alguém se atreve a quebrá-los.

quarta-feira, novembro 21, 2007

Pequenas frases

Há pequenas frases como "E tu?" que ficam sempre bem. São questões de educação, pelo menos. De respeito, reconhecimento, preocupação e carinho, na mais pura essência da sua utilização. E é por serem coisas tão simples que a sua ausência é tão monstruosa. Não custa praticamente nada. Custa somente dois dedos de testa. E o retorno disso é tremendamente grande. Por vezes inimaginável... O que vale é que quase todas as portas que atravessamos abrem para os dois lados. Pode não ser tão fácil como entrar, mas dá quase sempre para sair.

segunda-feira, novembro 19, 2007

Zombie

Não te vi a ir embora, embora saiba que foste. Sei que dormias debaixo do teu cobertor de ervas verdes, vivas. Sob a tua almofada branca de mármore, sofridamente rabiscada a preto. Eu sei. Eu sei que estavas lá. Ao meu lado. Na tua cama. No local onde descansavas os teus incólumes pedaços. Pedaços plenos de vida, cobertos por sôfregas cores em mil milagres.
Eu sabia que estavas lá. Por isso não podias. Não podias ser tu. Não eras tu, aquele ser vivo morto. Aquela sombra de gente, húmida, podre, de roupas andrajosas e movimentos atáxicos mas decididos. Não eras tu. Não podias ser tu. Não queria que fosses tu... Mas eras.
Eras deveras tu. Reconhecia-te nos mais pequenos pormenores que ainda ousavam sobreviver ao tempo. Estavas como sempre o teu feitio dizia que devias estar. Ciente de ti e das tuas capacidades. E era com essas crenças que avançavas sem qualquer tipo de temor. Com um objectivo. Em direcção a um alvo. Muito específico.
Os canos serrados tinham-te ao alcance. E não hesitaram. A primeira nuvem de chumbos levou-te uma metade completa da face. Tirou-te a visão e cegaste aí por completo, como se por alguma ligação misteriosa as pequenas esferas tivessem viajado também para o outro olho. Tirou-te o sabor. O sabor que agora seria do teu próprio sangue. Seco, coagulado. Mas sangue. Tirou-te o olfacto com que cheirarias o perigo como era teu hábito.
Mesmo com a cara completamente exposta, seguiste impávida. A segunda rajada foi-te menos generosa. A tua anca voou sem direcção, arrancando um enorme pedaço da pouca carne que ainda sustinha. Caíste como um cepo seco e oco. Rodaste ligeiramente no ar. Esticaste o braço para alcançar um apoio que nunca existiu. Aterraste e levantaste um monte de poeira que te cegou mais, se tal fosse ainda possível. Mas não era isso que te ia deter.
Arrastavas-te agora quase com os vasos esvaídos de dignidade. Mas não de perseverança. Demoraste, mas chegaste aos seus pés. Percebi que reconhecias aquelas solas. Bem demais. Mas isso não contava. Um dos pés prendeu-te a mão que o tentava abraçar. Olhaste para cima. Chorarias se conseguisses. Se tivesses força para o fazer. Pediste algo sabendo de antemão a resposta. A resposta que veio na ponta da arma, agora flectida para baixo. Eu não quis ver. Mas ouvi. Urraste no silêncio do teu interior. Bradaste já sem ar nos pulmões. Uivaste pela última vez... outra vez.
Quando voltei a voltar-me para ti, acedi a aproximar-me. Eu sabia o que ia ver. A tua mão escrita pelo sapato que te pulverizou os ossos. O crânio incompleto, vazio de tudo e cheio de nada. Eclipsado de esperança. A perna ainda presa a um tendão persistente e velho. Como querendo não se perder do conjunto que já não existia. E lá estava ele. O sufoco do último sopro. Do derradeiro impulso. Um buraco negro. Profundo. Trespassante. De um lado ao outro. Nas costas. Por trás do coração. Que desaparecera por completo. Em cinzas.
Foi por isto que te reergueste? Para que te ferissem de morte o coração, pelas tuas costas? Eu sei que não era o que querias. No meu pensamento pinto a tua cara que agora beija o chão. Não podia ser mais expressiva a sua ausência de expressão. Nem um zombie merece acabar assim.

terça-feira, novembro 13, 2007

Papa

Ser mais papista que o próprio papa quase nunca dá bom resultado. É péssimo quando começamos a cair nas nossas próprias convicções, a contradizer-nos e humilharmo-nos, a querer ser mais do que aquilo que somos. O nosso ego é feito à medida daquilo para que somos capazes e não estica incessantemente de acordo com as ambições que temos ou com as ambições que queremos fazer os outros pensar que possuímos.
Tudo piora quando há muitas coisas a subir-nos à cabeça. E não é sangue nem ideias luminosas. São comportamentos, pastas, estatutos, cargos, posições, vícios. Quando se pensa que se está em cima, tudo cá em baixo é pequeno. Pode-se assumir uma posição arrogante e falar como bem se entende porque no topo ninguém nos toca. A nossa pequenez é esquecida porque andamos sobre andas. A humildade e o bom-senso são para quem sempre os utilizou e nunca foi a lado nenhum e não para os que nunca deles fizeram uso e chegaram a muitos lugares. O como para isso não interessa. Interessa é estar lá. Interessa é impor o que achamos a ferro e fogo. Talvez nem a ferro e fogo. Porque a resistência dos vermes que nos admiram do nosso incólume cume é suposto não existir. É suposto vergarem-se perante tal poder. Submissos. Calados. Inexistentes.

Queriam, não queriam?

sábado, novembro 10, 2007

Conversas

Uma conversa estúpida feita por uma pessoa inteligente é tão ou mais louvável e agradável que uma conversa inteligente feita por uma pessoa estúpida.

sábado, novembro 03, 2007

Nada

Um cargueiro. É exactamente isso que tu és. Transportas mercadorias de um lado para outro. Entre continentes. Entre países. Entre cidades. Entre pessoas. Mercadorias que muitas vezes desconheces. Caixas cujo conteúdo ignoras. Bom ou mau, não é isso que te interessa. É o teu trabalho e sabes que o tens que fazer. De um lado para outro.
Como tudo, há portos e portos. Hoje chegaste cá. Chegaste a este sítio. A este sítio que eu acho que conheço e que tão estranho é para ti. Não me peças para que te explique alguma coisa. Eu percebo mas é-me impossível passá-lo a outros. Eu sei que não te sentes acolhido. Lançaste amarras como em outros lugares mas aqui elas não ficaram presas. Lançaste-as e a doca fugiu. Fugiu até que te queira apanhar. Até que ela tome essa decisão. Aqui é ela que manda. É ela que agarra quando quer, para largar quando nós menos quisermos. Quer queiras, quer não queiras... Aqui estarás sempre preso. Estarás preso a coisa nenhuma. A nada. Estarás preso ao nada.

terça-feira, outubro 30, 2007

Livro aberto

Os livros são para serem abertos e lidos. Certo. Mas há livros que não devem ser demasiado abertos nem demasiado lidos. Há livros que, invariavelmente, vão sofrer de lombadas dissecadas e de páginas deturpadas. Há livros que, quando demasiado expostos, tenderão sempre a verem-lhes impingidas frases, personagens, diálogos, bocas e outros tantos que tais, que nada têm em relação com a narrativa original. A burrice e a teimosia de ver (ou de mostrar) as entranhas mais recônditas de um monte de folhas de papel raramente dão bom resultado. A transparência e a honestidade de uma obra literária só fazem com que se torne mais vulnerável e sensível a tudo o que de bom existe à sua volta.

sábado, outubro 27, 2007

Irrita-me...

Irrita-me ter vontade de escrever. Irrita-me não conseguir escrever. Irritam-me a hipocrisia e a arrogância. Irrita-me o egoísmo. Irrita-me o altruísmo. Irrita-me a teimosia. Principalmente a infundada. Irritam-me os benfiquistas. Irritam-me ainda mais os sportinguistas. Irrita-me perder. Irrita-me ganhar (sempre). Irrita-me não dar o meu melhor. Irrita-me os outros não darem o seu melhor. Irritam-me o sol e o calor. Irrita-me a praia. Irrita-me a areia. Irrita-me o sal do mar no meu corpo. Irrita-me a falta de frontalidade. Irrita-me a traição. Irrita-me o desprezo. Irrita-me a ausência de integridade. Irritas-me tu. Irrita-me a ostentação. Irrita-me a cobardia. Irrita-me ele. Irrita-me a vida. Irrita-me a morte. Irrita-me a falta de tempo. Irrita-me o excesso de tempo. Irrita-me ficar à espera. Irrita-me fazer esperar. Irritam-me os alemães, os espanhóis e os norte-americanos. Irritam-me os roubos. Irrita-me a imperfeição. Irrita-me a incapacidade. Irrita-me a desarrumação. Irrita-me a falta de lógica. Irrita-me a desorganização. Irritam-me sapatos de vela com meias brancas. Irritam-me as meias brancas. Irritam-me camisolas de lã. Irrita-me não ser feio. Irrita-me não ser bonito. Irrita-me faltarem peças a um puzzle. Irrita-me o esquecimento. Irrita-me a relatividade. Irrita-me a incoerência. Irrita-me o barulho. Irrita-me o silêncio prolongado. Irrita-me uma nota desafinada. Irrita-me uma música demasiado alegre. Irrita-me um disco riscado. Irritam-me os violinos. Irrita-me dizerem que disse o que não disse. Irrita-me gostar. Irrita-me ter saudades. Irritam-me os Yorkshire Terrier. Irrita-me cair. Irrita-me não me conseguir levantar. Irrita-me não ter uma mão que me ajude. Irritam-me sussurros à minha frente. Irrita-me uma mousse de chocolate de plástico. Irrita-me o leite. Irritam-me as iscas. Irrita-me não pescar nada. Irrita-me não perceber. Irrita-me não saber. Irrita-me saber de mais. Irrita-me trocar os planos. Irrita-me dormir. Irrita-me perder o comboio. Irrita-me uma caneta não escrever. Irrita-me gastar dinheiro. Irrita-me não ter dinheiro para gastar. Irrita-me o passado. Irrita-me o presente. Talvez me irrite o futuro. Talvez até não me irrite. Irrita-me que alguém não tenha lido isto. Irrita-me que alguém tenha começado e não tenha acabado. Irrita-me que alguém tenha tido paciência para chegar ao fim. Irrita-me irritar-me.

sexta-feira, outubro 26, 2007

Mal parido

Quando as coisas começam mal não há bom futuro que se preveja... Perspectivas? Duvido... Se há coisa que não mente são os olhos e esses já estão a falar muito. A dizer demais em comparação com a fala. Correcção? Talvez... Pouco do que existe é irreparável. Veremos se este barco tem casco suficientemente robusto para aguentar com as vagas. Pequenas e grandes. Mas todas demasiado fortes e contraditórias.

quinta-feira, outubro 25, 2007

Decisões

A vida é feita, invariavelmente, de decisões que temos que tomar. Decisões que temos mas que não queremos assumir. Decisões que, mesmo tendo que ser encaradas, não o são simplesmente porque nós não queremos. E isso irrita-me.

segunda-feira, outubro 01, 2007

Definições I

Ginecologista: médico(a) que trabalha onde possivelmente muitos, ou pelo menos alguns, se divertem.

domingo, setembro 30, 2007

De novo

Vai começar de novo. Vai recomeçar outra vez. Não sei se será mais difícil ou mais fácil. Não me interessa. Sei, isso sim, que será diferente. Bem diferente... É bastante provável que vá sentir saudades (estranho seria se tal não acontecesse). Mas não quero que alguma coisa deixe de existir. Também não quero mais. Só quero o mesmo. Mesmo que seja de maneira diferente. É só disso que preciso. E da chuva que começa agora a cair. Oportuna. Quero essa água para me olear os gestos e as ambições. Os caminhos para as minhas metas e a lucidez para os meus desejos.

Quero voltar aqui, a este sítio, neste lugar. Quero regressar e dizer que estou cá de novo. Que estou cá outra vez. Tal como estou hoje. Mas talvez sem medo. Sim. Quero estar tal como estou hoje mas sem medo. Quero esse braço à volta do meu tronco. E essa boca encostada à minha... O resto sei que vem do beijo e com o beijo. Vou querer isto tudo tal como quero agora. Com muita força. Com muita certeza. Com muita esperança. Com muito sonhos. Contigo.

terça-feira, setembro 18, 2007

A língua das nossas mãos

Gosto de ver e perceber a linguagem das mãos. Acho que não há nada mais perfeito que o mover harmonioso de dez dedos para uma só finalidade. As mãos falam e dizem tanto mais do que as palavras que podemos proferir. E as mãos não mentem. Tantas vezes que o discurso é atraiçoado por um movimento subtil das falanges...

As tuas mãos são assim. Pequenas mas enormes. Gigantescamente enormes. São mais singelas que as minhas, mas abraçam-nas com uma facilidade que me espanta... Dizem-me muitas coisas. Dão-me calma, dão-me confiança. E, acima de tudo, dizem às minhas mãos que sabem o que elas estão a passar. Dizem às minhas mãos que as compreendem. Dizem que se tem que acreditar. Que se tem que lutar. Que há mãos que estarão ao nosso lado.

Às vezes nem eu próprio acredito no quanto me fazem falta umas mãos como as tuas. Às vezes sinto que quase caio se elas não me derem uma pequena palavra...

Um "passou-bem" de respeito para ti.

sábado, setembro 08, 2007

Aos bocados...

Hoje queria uma conversa, mas falta-me voz.
Hoje queria um abraço, mas faltam-me braços.
Hoje queria um pouco de calor, mas falta-me lenha.
Hoje queria um toque, mas falta-me tacto.
Hoje queria um beijo, mas falta-me boca.
Hoje queria uma emoção, mas falta-me coração.
Hoje queria uma alegria, mas falta-me sorriso.
Hoje queria uma miragem, mas faltam-me óculos.
Hoje queria um passeio, mas faltam-me pernas.
Hoje queria um sonho, mas falta-me sono.
Hoje queria uma sobremesa, mas falta-me apetite.
Hoje queria uma balada, mas falta-me ouvido.
Hoje queria-te a ti, mas falto-me eu.

quinta-feira, setembro 06, 2007

Muralha

Aí estás tu de novo. Estás no local de onde teimaste nunca mais sair. Cabra! Não me olhes do cimo do que pensas ser a tua integridade. Não me gozes mais com esse teu ar de perfeição. Por favor. Por ti. Não sabes que tenho sempre razão?
Circundas-me. Rodeias-me. Cercas-me.
Tentei cavar por baixo das tuas mais profundas e podres catacumbas. Mas elas são tão profundas e tão podres que é impossível fugir sob tal peso. Tentei escalar-te as superfícies húmidas e viscosas para te passar por cima. Mas a tua humidade e o teu visco são tão imensos que só dão para me escorrer e escorregar de ti. Tentei inclusive aproveitar as tuas muitas brechas e os teus muitos buracos. Mas, por muitos que fossem, a tua espessura era demasiada para mim. Para o meu feitio.

Aqui estou eu. Pela primeira vez seguro de mim. Não totalmente, mas enfim seguro. Aqui estou eu à tua frente. Ergues-te alta, com as tuas imensas pedras rachadas e furadas, molhadas e cobertas de limo, que vão apodrecendo à medida que se afogam no pântano onde assentas. Desta vez é que vai ser. Desta vez é que é. Vou em frente. E vou-te passar. Atravessar. Passo firme. Recto. Rígido. Convencido. Jocoso... Só mais um... Já está.
Gostaste? Eu sei que não... Não percebeste? Eu explico-te: o que não existe fisicamente não pode prender alguém a lado algum.

Hoje ultrapassei-te. Tirei tudo o que tinha a tirar de ti. Espremi tudo o que me poderias dar. Hoje estás seca. Hoje não passas de um sonho. Uma ilusão. Uma memória.

quinta-feira, agosto 23, 2007

Marionetas

Não és de papéis principais. Falta-te estampa para isso (tanta!). Preferes estar por detrás do pano, a comandar os fiozinhos de todas as marionetas que se mexem alegremente num palco que tu controlas. Sei que não o fazes por medo ou vergonha. Muito menos por parecer que o fazes pela calada. Todos sabem onde estás e o que fazes e os que vão noutras conversas só podem ser parvos por pensarem que aqueles bonecos articulados têm vida própria e movimentos auto-voluntários. Tolos! Cada milímetro de acção é o reflexo da contracção dos teus dedos, ao teu sabor. Ao sabor do que tu queres e do que te apetece.
Se o céu existe, certamente não tens lugar reservado ou cativo para ti. Não precisas dizer que não te importas muito. Já ouvi as tuas crenças de que tal lugar não existe, mas sim simplesmente um único outro mundo do outro lado. Já conheço a tua opinião em relação ao porquê de assim seres. Sim, és mau quando precisas. Tens uma memória grande. Gostas de dar a tua justiça às coisas. Chamem-lhe vingança se quiserem. Porque é que não mudas ou te moderas? Pergunta estúpida...

Pé ante pé, lá dança a marioneta. Tão bonita que é. Tão bem e graciosamente se mostra... Ups! Parece que tropeçou. Parece que lhe faltou um fio. Parece que foi de propósito.
Se calhar foi mesmo.

quarta-feira, julho 25, 2007

Mais um bocado

Hoje morreste mais um bocado... Hoje mataram-te mais um pouco... Mas tu não sabes. Tu ainda não sabes. Hoje apanharam-te de costas e degolaram-te um pouco mais a laringe. Cortaram-te a voz para que ninguém te oiça agoniar mais tempo algum. Ah, mas os teus olhos gritam tão alto... Ferem-me os tímpanos!
Tu queres mais. Os outros também. Mesmo de frente, conseguiram esventrar-te por completo. Não tens por onde sair, porque não quiseste sair mais cedo. Vê os teus pedaços espalhados no chão. Observa-os com atenção. Pouco mais resta de ti depois de te terem provocado tantos homicídios seguidos... Mas tu segues, com um bocado de cola, a tentar montar-te de novo. Sem enganos.
Achas que vale a pena... Achas que vale a pena?

quarta-feira, julho 18, 2007

An American Prayer

Summer’s almost gone. I thank God for that. No more hot days like those that I felt on my own skin while I dared to cross the country among a Spanish caravan. Although some may think otherwise, it wasn’t an easy ride…
I’ve reached my new town. My new home town. Los Angeles. L. A. city. I was told to meet my new boss over a bar, but I couldn’t face that at that moment. My legs were falling apart, so I decided to relax inside some kind of motel ‘till the end of the night (anyway, isn’t that the time when the bars are open?). Later that day, I headed to Love street (what a name!), trying to find “L’America”. A bright yellow and red neon sign couldn’t mark it better. I walked down the old marble stairs, which ended at an entrance guarded by some kind of feminine doorkeeper. She was hanging a cigar in her mouth. She looked straight at me and asked “Would you light my fire?”. Not sure if that was a tricky question, I chose to simply say that I didn’t smoke. Trying everything to avoid that strange creature, I was able to make my way in.
Inside, I asked for Mrs. Maggie M’Gill. Someone spat something like that she was in her “soul kitchen” (never understood what the hell it was supposed to mean). Behind some piles of dishes, I found her. What a lovely lady she was. An iron lady I should figure later. After all the formal presentations and dirty papers that were to be signed, she led me to my new corner. To my new piano.
I’m a regular guy. I’m a pianist and I play jazz for a living. Last month I was invited to travel from the Atlantic Ocean to the Pacific Ocean. With nothing left that could stick me at my old place, I took the chance without even thinking (“take it as it comes”, I once learned at school). And now here I am, with my fingers laid on a couple of white and black pieces of wood, playing an Alabama song (at least it was what I thought it was written in the sheet when I first gathered these notes). The people are strange but I don’t even bother. They enjoy my music as much I enjoy playing it and that’s what makes me sleep tight every single day.
I was preparing myself to the last melody when suddenly I spotted you. I wasn’t sure if my eyes have seen you. Like a spy, I faced the entire audience just to fake that I looked at you once again. Only at you. It couldn’t be true. It just couldn’t. Had I just fallen in love with that strange woman? With that strange L. A. woman? Oh God!... What else?!? I guess that my wild love was now in the hands of that wild child…
4 o’clock shouted the watch when I left the bar. I wasn’t feeling like going home so I just walked around town for a while. I wanted to tell all the people the sensation inside me, even if it was such stupid as it seemed. Yes, the river knows it. The peace frog that was jumping over some rocks on its margins too. So I sat on the top of a wall, with my feet hanging from there, not to touch the earth. I was flying so high and I didn’t want anything that could link me with the real world but my twentieth century fox. I stood there, waiting for the sun to rise and when I finally went inside my bed, I decided not to care about the running blue cars that hiss by my window. Not today.
Blues’ night. That’s what I liked to call to every Sunday night. “Blue’s night with Crawling King Snake” (everyone in the show business has one own nickname and this is mine, due to my tattooed snake that crawls from my left shoulder to my left wrist). As part of my routine, I said “Hi” to the unhappy girl at the door and moved towards my corner. I knew you would be there and that’s why I had it already planned all over my head. In my usual break between Shaman’s Blues and Roadhouse Blues, I was going to face you. “When the music’s over, you’re going to break on through every fear of yours and do it”, I wasn’t able to stop reminding it. With my own beliefs previously dealt, I approached you and I was only able to articulate “Hello, I love you”.

Today is Sunday. A blue Sunday. A very blue Sunday indeed. Summer’s back. An extremely hot Indian summer. Just like those we can see on television, when the native-Americans fought the cowboys. Now, that everything had reached the end, I’m moving west towards another continent. It’s dark outside. It’s time to take my moonlight drive along the deck of what we once liked to call our crystal ship. A ship that’s now only a ship of fools. A ship of the fool.
Strange days, those we lived together. The days of our wintertime love that marched in a soft parade to the only goal available to someone like you. You always thought that your generous breasts and your nice piece of ass would make you the queen of the highway of every man that passed, pass and will pass by you. Your body makes you such a wishful sinful. A changeling. I only asked you to love me two times and what have you done? You made me your backdoor man. I’m no person for that role. I can still hear your voice like a wasp whispering in my mind “We could be so good together because you make me real, alive, more perfect. We could be riders on the storm. For every storm that there’s to be beaten. We could be just us, as one.”. It still gives me the creeps every time you still touch me, even if it’s a product of my imagination. My body shakes of hate. I feel I was an unknown soldier fighting an impossible war, with a five to one disadvantage. A war that, of course, I lost.
I’ve been down so long that I can’t see your face in my mind anymore. Is that good? I don’t know. Until now, I love her madly without any question. Until now, I hate you badly without any hesitation. Although confused, there’s one thing that I’m right for sure: you’re lost little girl.

After days travelling over lots of horse latitudes and seeing lots of crocodile coasts, I’ve finally reached my new home town. “Land ho!” screams an old mad man somewhere in my back. Some moments later, I found my dream. My house. My hyacinth house. I looked closer. I got closer. Alone, I opened and pass through them. Through the doors.

sexta-feira, junho 22, 2007

Huguinho

Lembras-te? Lembras-te de articulares esta palavra? Todas estas 8 letras? Lembras-te ou esqueceste-te como todas as coisas que só não aconteceram para ti? Duvido seriamente que ainda cultives estas memórias. Eu faço-o. O meu inconsciente obriga-me. Oiço o som tão claramente todas as vezes. Sinto-o. Arrepia-me. Assusta-me. Ainda me ardem e escaldam as mãos de ter tocado na carne que as proferiu. Tenho-as sem pele, feridas de morte. Contraídas. Desfeitas.
Não tinhas o direito. Não tinhas o direito de me amputar assim. De dizer o meu nome como o dizias, de forma sensualmente mortal... De fazer toda as asneiras que fizeste! Eu poderia ter todo o tempo do mundo para me contares o que quisesses. Para justificares que 2+2 são 3. Mas não são! Nunca serão. Só sem regras, escrúpulos ou princípios.
Diz-me histórias, glórias, troféus... nojentos. É só isso que flui hoje e sempre de ti. Prémios das desgraças dos outros, das vergonhas que impuseste aos outros. Conquistas levianas, egoístas e egocêntricas. Mas não precisas falar mais (também sempre foste mais de acções impulsivas). Eu sei tudo o que dirias. Aquilo que sempre disseste. Mentiras e palavras doces. Cortinas para tapar quem queres. Como eu.
E por favor não chovas. Não molhes inutilmente ninguém. Não corroas mais pessoas com esse sumo ácido, verde, falso, traidor. Mesmo que sejas uma mulher da vida... de não sei quem. Ninguém merece um avo que seja vindo daquilo que és.
Sabes... só se é rei por um dia. Tu já foste rainha ou o que quer que tenhas sentido que foste. Subiste muito alto. E bem depressa. Agora... vais cair. Não digas que já tropeçaste, porque ainda vais mais fundo. Não. Mais ainda. Mais que isso. E não imaginas o prazer que eu vou ter de não te estender a mão. O prazer que eu vou ter de passar por ti. Por cima de ti.

Até... sempre.

sábado, junho 16, 2007

Calçada

Como eu digo e acredito, tudo acontece por uma determinada razão. As pessoas existem por uma determinada razão. Se calhar é só disto que tenho que me mentalizar mais. Que tudo o que se passa são pedras de uma imensa calçada portuguesa que eu tenho que construir. Uma imensa praça que eu tenho que calcetar com desenhos imperceptíveis no momento em que corto as pedras e as tenho na mão. Desenhos que só vou perceber quando conseguir acabar este chão e tiver a coragem de subir bem alto para os ver lá de cima. Bem do cimo de algo que quero acreditar que é o sítio. Aquele sítio onde, de repente, por magia, tudo fará sentido.

terça-feira, junho 12, 2007

Perspectiva

Se é quando as pessoas não estão que nós sentimos a falta que elas fazem, também é verdade que é quando as pessoas não estão que nós sentimos a falta que elas não fazem.

segunda-feira, maio 28, 2007

Cem medo

Gosto de escrever porque é com palavras que eu consigo transpirar. Cem medo do que possa dizer. Cem medo de quem me possa estar a referir. Sei que posso e devo dizer aquilo que penso porque senão corro o risco de cair no erro de não ser coerente comigo próprio. Ocupo o meu tempo com esta ocupação porque me sabe bem, me preenche os sentidos e me ateia a alma. Sabe-me bem dizer mal de quem eu quiser, cem medo. De elogiar tudo o que o merece, cem medo. Aqui, neste pedaço da world wide web, consigo ser eu próprio. Cem hesitações. Cem receios. Cem medos. E é só isso que espero e quero continuar a fazer.

Hoje chego ao post número sem. E hoje também acabo mais um ciclo. Porquê? Porque, desde a última paragem, muitas coisas aconteceram. Comecei muitas coisas que consegui agora terminar, resolver, concluir: atrevi-me a voltar ao passado e a enfrentá-lo de novo para ter a certeza que escolhera bem o presente; tentei perceber o presente nas suas mais diversas vertentes para saber qual seria o meu futuro; ponderei e escolhi o meu futuro mais próximo, porque sei onde quero chegar e como lá quero chegar. Hoje acabo mais um ciclo porque sinto que os dedos pedem outra escrita. Não uma escrita "vomitada" ou demasiado sentimental como fora até agora. Sinto-os frios e práticos. Directos. Aguçados. Quero-lhes dar tempo para escolherem. Até lá vou andando por aí. Não sei quando volto. Pode ser amanhã ou muito depois. Não faço ideia. Mas sei que volto.

segunda-feira, maio 21, 2007

Até já

Passei muito tempo a meditar. A meditar neste preciso assunto. Tive que montar todos os puzzles na minha cabeça. Perceber onde é que cada peça cabia. Conversas, gestos, imagens, actos. Pessoas.
Tive que pensar porque detesto andar à deriva. Ao sabor do poder que outros querem ter na minha vida. Tenho a necessidade de minimizar as mudanças que as acções e as opiniões dessas pessoas possam ter naquilo que é importante para mim. Tenho que conseguir justificar tudo o que acontece segundo as MINHAS regras. Para mudar as coisas segundo somente o que EU quero.
É por isso que escolhi este caminho. Porque não quero acreditar em fantasias, gnomos, bruxas, duendes, mágicos e tudo o resto que não existe. Fora com a porcaria dos "era uma vez", feitiços, pragas, promessas de "felizes para sempre" aplicadas ao que quiserem. Escolhi este rumo porque acredito em histórias com reis humildes e com uma capacidade de entrega imensa e com crianças grandes que são simplesmente o mais puro que existe. Sempre sob uma música de fundo, simples, reconfortante, ..., espectacular. Uma música que não tenho dúvida de querer, agora, continuar a ouvir.

sábado, maio 12, 2007

Solene

Hoje foi um dia especial. Um dia solene. Hoje decidi abrir a minha caixa de areia. Decidi visitar o meu mundo. Decidi passear no meu bosque. Decidi recolher-me na minha clareira. Decidi ir à minha sepultura. Hoje fui enterrar mais um bocado de mim. Convicto do que fazia, cavei com a certeza do quão fundo tinha que chegar. E foi lá em baixo que depositei este pedaço de vida morta. Fechei de novo a campa. Pensei-a e reflecti-a um pouco. Ofereci-lhe uma rosa negra viva cuidadosamente espetada sobre a terra ainda húmida. E disse-lhe adeus.

Obrigado às duas pessoas que me trouxeram até aqui. Que me esticaram o braço desde o cimo da minha falésia para que eu me içasse a partir do meu areal. E que não me deixaram cair.

domingo, maio 06, 2007

Cruzamento

Não há dia que eu não acorde e não me depare com este dilema na minha cabeça. Vejo-me numa estrada imensa que vai em frente. A dada altura sinto e sei que tenho que escolher um de dois caminhos. Ambos vão em frente, embora um deles recorra a um pequeno desvio inicial. O problema é que se estendem os dois demasiadamente para o infinito, impossibilitando-me de ver todas as suas pernas e as suas paragens finais. Há dias em que penso seguir um, outros em que quero fazer o contrário.
Já pedi ajuda a quem me poderia ajudar. Só vejo bocas a abrirem e a articularem silêncio. Aquele silêncio irritante e brutal. Só vejo corpos a tomarem a iniciativa de virarem as costas. Costas enormes e cruelmente opacas. Talvez estas desajudas sejam as ajudas de que eu estou à procura. Talvez o problema seja só o eu não acreditar nelas e pensar que um dia ainda me vai cair um sinal de sentido obrigatório para o outro lado.
Simplesmente não sei o que fazer. Simplesmente não sei por onde ir. E o cruzamento está cada vez mais perto. É já ali ao virar do dia.

quinta-feira, maio 03, 2007

Azia

Quem disse que a vida era difícil? Bah! A vida é fácil. Muito fácil até. Tudo o que acontece é lógico. Tudo segue uma ordem. As pessoas fazem e reagem em resposta a estímulos: o estímulo A, naquela pessoa, dá sempre a acção B. As pessoas são básicas. São basicamente ciúmes, raiva e inveja. E a espaços mais largos, bondosas, cooperativas, altruístas. E é isto que a vida tem de engraçado: procurar olhar para adivinhar o que vem a seguir. É curioso olhar à volta e ver que 2+2 são sempre 4. É delicioso ver que a vida é perfeita como a matemática. Acreditem, esta abordagem quase nunca falha.
E quase nunca porquê? A vida só é difícil para quem não quer acreditar na sua facilidade (o pior cego é aquele que não quer ver). Está lá sempre tudo. Nada nos devia surpreender. Porque existe sempre alguma peça por estrear atrás de uma cortina de um palco. É só puxar a ponta e espreitar. Não querem estragar a surpresa? Tudo bem. Mas não refilem depois. Limitem-se a comer... e calar.

segunda-feira, abril 30, 2007

Para quem enfiar o barrete...

"As pessoas que nos amam têm que nos conhecer um pouco melhor que nós próprios."
Eduardo Sá

É por isso que é delas que esperamos, nos bons e nos maus momentos, acima de tudo, compreensão.

domingo, abril 29, 2007

Dice's Boy

A partir de agora começa o jogo a sério. O meu jogo. E no meu jogo joga-se no meu tabuleiro, com as minhas peças e com os meus dados. Com as minhas regras! Eu é que sei quem joga e quando joga. Eu é que sei quem ganha. E sei que não vou ser eu a ganhar. Nem eu nem outro alguém. No meu jogo ninguém ganha. Todos perdem. Porque o jogo é meu e é assim que eu quero.

Nazarena

Todos os dias te levantas de manhã. Bem cedinho. Sabes sempre o que vais fazer durante todas as horas que vais ter pela frente. Sais convicta e hesitante. Queres mas tens medo. Desces essas ruas estreitas e de piso irregular. Com o azul ao fundo. As tuas roupas negras escuras, acompanhadas pelos 1001 folhos das tuas largas saias, cruzam-se com ingleses, espanhóis e franceses. Estrangeiros para o país e para ti. Pessoas que não te percebem. Porque não vivem a tua vida.
Caminhas até ao areal. Ele é talvez a tua primeira casa. É nele que te sentas religiosamente há anos. Vês os homens vir da faina, em barcos velhos mas que ainda flutuam. Que trazem o alimento e a saudade de muitas famílias. Mas o teu barco não voltou. Não voltou desde que saiu naquele breve momento que tão bem te lembras. Sabes que não virá. Mas mesmo assim esperas por ele. Não te cansas de o fazer só porque queres que ele venha. Que te traga o teu peixe e o teu conforto... Isso nunca irá acontecer. Foi assim que as ondas do mar quiseram. Estava escrito a fogo na água que consegues ver até ao horizonte.
Regressas. Já de noite. Amanhã sabes o que farás. De novo. E será sempre assim. Até que um dia tu vás. E também não voltes.

quinta-feira, abril 26, 2007

Prioridades

Cairia o país se o primeiro-ministro tivesse faltado a um exame do seu curso para ir plantar uma árvore. Só por achar que esse acto lhe serviria melhor para a sua futura função de ministro do Ambiente que o mero acto de preencher uma folha de papel para lhe dar habilitações. Ainda bem que isso não aconteceu.

terça-feira, abril 24, 2007

Par de pés

O corpo humano foi feito na perfeição. Basta para isso ver a razão para que foi feito com dois pés... Eles formam um par, um esquerdo e um direito, para que na areia molhada da praia caminhem alternadamente, respondendo e discutindo saudavelmente um com o outro.
Ao olharmos para uma caminhada gravada no areal, sabemos que a seguir a um pé direito virá um esquerdo. E vice-versa. Uma grande depressão encimada por outras cinco mais pequenas pedindo a resposta do seu inverso. Direito, esquerdo, direito, esquerdo, direito, ...
Faria sentido ver um só pé direito a deixar perguntas soltas? E as respostas do esquerdo?
Faria sentido ver esse mesmo pé direito a tentar responder às suas próprias perguntas, pisando o trilho de ambos os lados? E as respostas do esquerdo?
Todos os pés merecem um par. Por isso é que fomos feitos com dois.

domingo, abril 22, 2007

Pureza

Não há nada mais puro que a mera junção da água com o sal. A forma como ambas se complementam e os motivos que levam à sua união são simplesmente formidáveis. É delicioso vê-las caminhar lado a lado, como um só. Como um que são na realidade. Admirar como o conjunto formado desliza de modo suave por cima da imensa esfera que vê e vive tudo neste mundo. Como turva a bola que muitas vezes devia e merecia ser opaca. Mas a água salgada faz questão de a rasgar de um lado ao outro. Até à beira do abismo.
Aí hesita. Protege-se. Resguarda-se. Ganha força. E depois... cai. Rola como seixos ao sabor das vagas de mar. Resvala por fendas, proeminências, desejos, promessas. Fogo. Apaga-o ou aviva-o. Dá-lhe expressão máxima.
E depois o fim. Um mergulho no infinito. O despedaçar vil numa qualquer superfície. O separar da união perfeita. Ou então... Ou então o aninhar numa mão quente.

segunda-feira, abril 02, 2007

Peixe

Em vez de teres usado a tua própria cabeça, deixaste que fossem os outros a usar o teu corpo. E eu que pensava que subir na vertical era mais fácil que na horizontal...
Já o ditado o diz: pela boca morre o peixe.

terça-feira, março 27, 2007

Pensamento solto

A minha religião sou eu.

terça-feira, março 20, 2007

Inferno

Fervo de raiva as lágrimas salgadas que choro cada dia, há já algum tempo. Cheira a queimado, a sangue, a dor. A incongruência e incredibilidade. É com certeza castigo grave. Ferros cravados na minha carne. Nos meus sentimentos. Amputação de crenças ou vontades de acreditar. Isto é somente o preço a pagar por quem escolhe seguir os seus princípios mais nobres e morrer com eles. Sou assim. E sei que não presto. Nem para mim e muito menos para os outros.
Sou como uma cana verde. Dobra, verga, contorce-se. Mas não quebra. Só parte quando está seca, velha, chupada de todo o seu interior. Vazia. Morta. Podre. Preciso de um sopro gélido que me petrifique e me destrua o resto do que ainda tenho. Do nada que nunca vou perder.
Por favor, quero estar sozinho. Só sei estar sozinho. Deixem que o meu fogo me consuma e me aniquile. Quero não ser eu. Quero não ser isto. Quero ser... não sei. Anseio por sonhos, ilusões. Parvoíces. Edifícios sólidos feitos de cartas que ruem cinicamente a meus pés. Para que sirvo? Digam-me. Diz-me. Não tenhas medo. Quero ouvir-te gritá-lo na minha cara. Quero que digas "zero", "vazio", "nada". Ou simplesmente olha-me nos olhos e não digas uma única palavra.
Não quero desaparecer ou morrer. Quero vaguear. Ao sabor da vontade de algo que sempre me transcende. Quero sentir o impacto com que essa punição me arremessa brutalmente contra as paredes e me desfaz cada pedaço de esperança e felicidade. Quero ver o pó que resta de tudo isso. De mim. Quero uma borracha para te apagar e para me esborratar. Quero perder a lucidez. E a nitidez. Para que nos lembremos sempre de nos esquecer.

domingo, março 18, 2007

Porque

"Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão.
Porque os outros têm medo mas tu não.

Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.

Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.

Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não."

Sophia de Mello Breyner Andresen

sábado, março 17, 2007

Renascimento

Há já alguns anos que estava morto. Morto, decomposto e muito bem enterrado. Todos à sua volta tinham já partido para outra vida em que ele não existia. E estava tudo bem... Até tu, com poderes que nunca te deveriam ter sido concedidos, o resgatares de novo à vida. Qual foi a tua necessidade? Porque o fizeste? Era tudo tão certo e tão directo. Não tinhas razão para complicar tudo, baralhar e dar de novo. Tinhas o ás e agora saiu-te o duque. Tu procuraste, tu quiseste, tu conquistaste.
Bem-vindo de novo ao imaginário de todos nós. Que a viagem do teu funeral e da tua campa tenham sido boas. Já tínhamos saudades. Saudades de te ver de novo em acção. A fazeres aquilo que poucos sabem. Bem-haja ao teu renascimento.

quinta-feira, março 15, 2007

Factor casa

Sei perfeitamente quais são as minhas acções e as minhas escolhas que não me fazem ganhar as pessoas. Que me fazem perder essas pessoas para outras. Sei que perco oportunidades de criar relações. Oportunidades que surgem em terrenos que não são meus. Em terrenos que não sei pisar. Onde pisar. É quase como jogar sempre fora. Com um público que não é nosso. Pena que só consiga jogar em casa. Onde os outros também não sabem jogar. Onde os outros também não entram. Onde os outros não serão capazes de esperar. Esperar por mim.

quarta-feira, março 14, 2007

Comboio

Estou perdido e enganado. Vejo-me numa enorme estação de comboios, com um número incapaz de ser contado de carris a partir numa quantidade ainda maior de direcções. Olho para um placard e só consigo vislumbrar luzes vermelhas a acender e a apagar numa ordem síncrona que para mim é completamente desconexa. Não me resta outra escolha que não confiar no meu instinto. Fecho os olhos, rodo sobre mim mesmo e dirijo-me à primeira máquina que se me assoma. Entro na primeira carruagem que me acolhe. Sento-me no primeiro banco que me acena. De repente oiço o pesado fechar de sentença atrás de mim. E sigo caminho. Naquele comboio, naquela carruagem, naquele lugar.
Merda! MERDA, MERDA, MERDA!!! Enganei-me... Este não é o meu lugar. Esta não é a minha carruagem. E pior: este não é o meu comboio. Raios partam o meu instinto. Raios partam os meus sentimentos que tão estupidamente sempre falham. Agora viajo para um destino que desconheço... mas que não é meu.

domingo, março 11, 2007

Escadas

Quero escadas que me ajudem a evitar as descidas mas que também me acompanhem nas subidas.

Resignado

Gostava tanto que me desses sinceridade. Quer dizer... Isso se calhar já tu me dás, apesar de não ser aquela que eu queria. Tudo bem. Eu aceito, mas resignado. Se já me dás isto, quero então que me dês igualdade. Se te der um, quero que me dês um também. Não preciso de dois. Só um. Dás? Não acredito. Por mais que digas que o fazes e que o farás sempre, a realidade é que não te foi concedida essa capacidade, no que a mim diz respeito. Se calhar o melhor é mesmo não pedir nada. E aceitar. Resignado.

quarta-feira, março 07, 2007

Vidros

Custa-me que os meus espelhos não me devolvam o reflexo do meu semblante triste, o aperto do meu coração e o brilho das minhas lágrimas. Em vez disso, mostram-me alegrias, festas e gargalhadas. Tudo coisas que não são minhas.
Os meus espelhos não são espelhos. São vidros.

terça-feira, março 06, 2007

Sonho

Era uma vez, num sítio que não interessa agora para o assunto, ...
Mas para que é que eu estou aqui a escrever isto? Nunca vai acontecer.

Completo

A desvantagem dos puzzles é terem um número fixo de peças, pré-definido desde o início da sua criação. Realmente, não é de todo estético ver um rectângulo perfeito com uma peça emplastra colada de lado... É por isso que quando os puzzles estão completos, já mais nada lá entra. Mesmo que exista uma peça que tivesse a forma perfeita para encaixar num lugar do conjunto... já ocupado.
Azares de quem chega atrasado... Problema de não existirem lugares marcados (ou talvez não)... Preocupações das peças soltas... Indiferenças dos puzzles cheios...

sábado, março 03, 2007

Mereceram

Às vezes penso nas pessoas que magoei intencionalmente. Aquelas a quem um dia eu decidi fazer pagar na mesma moeda ou talvez numa um pouco mais cara. Recordo e tenho vontade de voltar atrás. Regressar ao passado e poder alterar o que fiz na altura. E hoje sei que faria quase tudo de maneira diferente. Desta vez, juro que as pisaria com muito mais força e requinte. Que as torceria mais minuciosa e totalmente. Que as faria agonizar nem que fosse por um mero e efémero segundo a mais. Magoei-vos de plena consciência e se estou arrependido de algo, é de não o poder ter feito mais cedo ou de um modo bem pior. Mereceram.

quarta-feira, fevereiro 28, 2007

Mini-saia

"As estatísticas são como as mini-saias: mostram muitas coisas, mas não mostram o que interessa."

Às vezes vale a pena levantarmo-nos às 7 da manhã para ir assistir a umas aulas teóricas de uma universidade qualquer, só para ouvir pérolas como estas.

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Boneco de neve

Um boneco de neve é feito daquela coisa branca e fofa que costuma cair do céu... Como é que se chama mesmo? É isso! Neve!
Um boneco de neve é feito de neve que costuma cair quando o tempo está agreste e as nuvens pretas lá de cima choram lágrimas que gelam pelo caminho antes de chegarem a uma qualquer superfície onde possam repousar. Com as mãos protegidas por luvas, é normal fazerem-se duas bolas enormes, uma por cima da outra, simulando um corpo e uma cabeça. Dos lados do corpo, colocam-se dois galhos fracos como muitas das fraquezas que se têm quando as coisas não correm bem, mas com força para abraçarem tudo o que quiserem. À frente, ainda no corpo, vêm-se 2/3 botões que fecham um casaco que não se vê, invisível como o sofrimento que só uma atenção especial descobre. Ao pescoço, um cachecol quente como que a representar o sufoco que muitas dificuldades causam constantemente e às quais pode apetecer sucumbir. Na cabeça, a tradicional cenoura ocupa o lugar de todas as mentiras que se acumulam com o arrastar do relógio, num crescendo infindável. Os olhos, duas pedras, podem servir para serem arremessados contra um qualquer vidro onde eles próprios se vêem, só para negar esse sentido às vezes demasiado revelador. No topo, um gorro a proteger do frio que muitas vezes a solidão cria na mente e que se estende a todo o restante organismo.
E depois surge aquele dia feliz e alegre de sol. Aquele reconfortante calor. E o que acontece ao boneco de neve? Derrete! E para que serve agora? Para nada. Agora é uma enorme poça de água que se mistura com a terra onde estava assente para formar um insignificante monte de lama. Os galhos rebentam e criam árvores fortes a cujo topo quase ninguém chega. Os botões do casaco tornam-se órfãos do ser que os sustentava. O cachecol é já supérfluo para qualquer ocasião. A cenoura mirrou como se fosse possível esquecer todas as verdades que não se contaram. As pedras rolaram sobre si e perderam-se no chão de onde vieram. O gorro é recolhido numa gaveta com cuidado, para que, num outro momento de solidão, num dia frio de tempestade, possa vir a aquecer a cabeça do velho e usado boneco de neve. Do sempre eterno boneco de neve.

quarta-feira, fevereiro 21, 2007

Importância

Só temos capacidade para perceber que algumas pessoas são importantes para nós quando nos afastamos delas. Tornam-se parte de nós quando temos saudades. Quando nos faltam. Se por um lado é na solidão que eu me encontro a mim mesmo, é também na solidão que eu começo a procurar os outros. As outras partes do meu eu.

quinta-feira, fevereiro 15, 2007

Finalidade

Para mim, tudo o que existe tem um propósito. Bom ou mau. Reconfortante ou demolidor. Cada coisa que acontece tem necessariamente um fim...
Todas as letras são escritas para serem lidas. Mesmo que possam ser interpretadas da maneira errada.
Todas as músicas são compostas para serem ouvidas. Mesmo que possam ser desligadas a meio.
Todas as perguntas são postas para terem respostas. Mesmo que possam ser um mero "Não sei".

sábado, fevereiro 10, 2007

Dualidades

Disseram-me um dia que desempenho tão bem o papel de amigo quanto o papel de inimigo. Sinto-me elogiado por pensarem que faço tanta coisa bem feita.

Uma questão de tempo

Falhaste tão redondamente. Fizeste erros, para mim, tão infantis. Pormenores que não vou esquecer. Aliás: pormenores que eu vou fazer questão de me lembrar. Sei que o tempo encarregar-se-á de relevar essas pequenas coisas que eu vejo. Aquelas falhas nos alicerces das muitas paredes que, por isso, cairão. Reconforta-me saber que o tempo me dará razão. Apesar de querer estar errado...

Uma estrada

Quero um dia enveredar por uma estrada bem larga, que possa percorrer sozinho. E quando por lá for, quero olhar para trás, por cima do meu ombro, e ter consciência que tinha razão. Quero crer que abandonei tudo o que tinha para abandonar. Principalmente quem antes me abandonou.

quarta-feira, fevereiro 07, 2007

Feitios

O principal problema do meu feitio de merda é não conseguir odiar minimamente as pessoas que eu adoro de verdade.

segunda-feira, fevereiro 05, 2007

O meu mundo

O meu mundo começa no meu quarto. No sítio onde tenho as minhas coisas arrumadas como eu quero. No sítio onde eu próprio me arrumo comodamente. É aqui que eu vivo e que a minha vida ganha vida. Livros, puzzles, espelhos... Tenho aqui tudo. Mas aquilo que guardo com mais afinco é a minha caixa de sapatos cheia de areia e areias. Areias que um dia foram pedrinhas. Pedrinhas que fizeram parte de enormes rochedos.
Gosto de, solenemente, abrir a tampa da caixa feita de cartão. Cartão muito pesado. Gosto de depois olhar lá para dentro e agarrar naquele pedaço de matéria que não é mais do que a suficiente para me encher uma mão fechada. Mão essa que com toda a raiva cuidadosa espalho ao longo do meu mar. Aquele que é feroz e se levanta gigantescamente sobre o imenso areal de quilómetros que eu acabo de estender. É nesse manto de grãos que ando muitas vezes. Descalço. Deixando os meus pés marcados na fusão de água e calhaus minúsculos do meu tamanho, que o próprio líquido se encarrega de apagar ou recolher, na ânsia de queimar a saudade que virá até que um novo pé se decalque. Aqui sinto gotas de oceano a espetarem-se na minha pele. Frias e aguçadas como... gotas de oceano. Que me rasgam o corpo. E que tão bem me fazem sentir...
Muitas vezes recolho-me na base de falésias enormes. Daquelas que tendem verticalmente para cima. Para um lugar onde, cá de baixo, vejo mãos e braços que me acenam e que se esticam na minha direcção. Membros que eu tento freneticamente agarrar, como se tivesse medo que o meu próprio mar me afogasse. Membros que eu de facto consigo agarrar, sempre com algum critério que às vezes eu próprio desconheço: mais robustos, mais despidos, mais básicos. Membros que penso agarrarem-me suspenso enquanto eu precisar de arranjar forças para eu próprio acabar de subir o que falta. Membros que por vezes me largam sem se preocuparem se caio de costas num colchão de penas ou numa estalagmite de ferro. Se sobrevivo ou me desfaço.
No topo da arriba, passeio no meu bosque. Por entre as minhas árvores. Sobre as minhas folhas. Debaixo dos meus ramos. Ombreio com troncos grossos que o meu corpo não abraça, tropeço nas suas raízes que os meus pés não reconhecem e esgueiro-me na escuridão que as suas copas impedem de ser penetrada brutalmente por qualquer fio de luz. E por onde quer que vá, é sempre à minha clareira que chego. Uma clareira escura. Preta. Onde não há bosque, nem árvores, nem folhas, nem raízes, nem ramos. Só terra. Molhada. Vazia. Infinita. Onde jaz uma sepultura. A sepultura das minhas coisas. A minha sepultura. Onde eu choro e recordo tudo o que enterrei. Onde talvez durma mais leve e mais acompanhado. Onde me (re)visito e me (re)completo.
À noite, quando volto, sei as ruas que dizem para eu percorrer. As ruas que eu não percorro. Atalho pelo caminho maior. Aquele que é estreito e ladeado por imensos edifícios enormes sem janelas. Edifícios sobre os quais eu ando e que cedem sempre ao meu peso. Que colapsam para dentro sob mim. Admiro os cartazes de publicidade, para mim sempre lunarmente brancos. Preenchidos à minha maneira para que me possam absorver para o seu interior, ganhando vida ao sabor do que me apetece. Sigo as vias com sinais proibidos. Não paro nos STOP's. Sigo contra o sentido de prioridade. Ignoro as passadeiras. Simplesmente faço os meus sinais e o meu trânsito. E é assim que chego com segurança, de novo, ao meu quarto. No sítio onde tenho as minhas coisas arrumadas como eu quero. No sítio onde eu próprio me vejo chegar comodamente.
Este é o meu mundo. Este sou eu.

quarta-feira, janeiro 24, 2007

Dizem que se chama plágio

Eu podia escrever sobre "o rio da minha aldeia". Mas já alguém antes de mim escreveu sobre isso.

domingo, janeiro 21, 2007

Livros

Sabe bem pegar num livro novo e começar a abri-lo à nossa maneira. A folhear cada pedaço de papel como nos apetece, a interpretar cada palavra de acordo com a nossa maneira de ser, a sonhar com a história que cada um deles contém. Histórias daquelas que não acabam, que percorrem livros com mais de 500 páginas e que ainda têm a capacidade de saltitar de volume em volume num caminho que se crê que vai sempre em frente.
Um livro deveria ser algo em que só se pega uma vez. Algo que só se larga porque a história chegou ao fim. E aí deveria ir para a prateleira. Para aquela mais alta, onde nunca mais ninguém lhe descansaria a vista em cima. Mas há sempre aquele dia em que, no meio de uma limpeza qualquer, se volta a encarar aquele objecto, já com a capa cheia de pó, com as páginas amarelas de tão velhas e dobradas e gastas de tão viradas. Se calhar é normal perder um pouco de tempo a voltar a olhá-lo, com alguma nostalgia, e reviver mentalmente tudo o que se viveu e sentiu quando se esteve no seu interior. Os pedaços de papel, as palavras e as histórias.
Há quem, arrebatado por essa nostalgia tão inconsciente e animal, se atreva a pegar naquele pedaço de passado e a voltar a lê-lo, mesmo que isso signifique largar um livro novinho que ainda há pouco se começara. E muitas vezes essa saudade dá somente lugar à desilusão por já se conhecer a velha trama de trás para a frente. De se saber como começa e, sobretudo, como acaba. Ou melhor, porque acaba. Descobre-se que aquele objecto já está completamente descoberto. Que não tem mais nada para descobrir. Está lido.
Tenta-se depois voltar ao livro novo, que com tanto cuidado se tinha tentado obter. Mas por capricho do livro, este muitas vezes deixa de abrir, ou se o faz, nunca mais vai contar a mesma história de antes.

sexta-feira, janeiro 12, 2007

Cromossomas

A verdade é que te admiro. Principalmente essa tua capacidade despreocupada com que corres pelos teus caminhos. Apesar de me irritar esse teu "conformismo", invejo-te a articulação para te dares aos outros. De te rodeares por imensas pessoas que conseguem gostar de ti. A sério. Por seres tu.
Só tenho pena por não mostrares interesse por esse teu valor enorme. Que não cultives o carinho que os outros te dão ou que não te trates, a ti e a tudo o que fazes. Temo que vais cair ainda bastantes vezes. Espero que não muitas nem muito altas. Mas tens outra coisa que gostava de ter: um espírito de "sempre-em-pé".

terça-feira, janeiro 09, 2007

És assim

Cepticismo. É esse o maior dos teus problemas e dos teus defeitos. É esse o maior dos teus pecados. É essa tua necessidade de não acreditar nas pessoas... Porque é que o fazes, o continuas a fazer ou não o deixas para trás? Porque é que te permites a essa limitação, a essa corda, a essas correntes tão pesadas, dolorosas e incomodativas? Talvez não mereças quem tens, por mais forte que essa ligação possa ser. Talvez só te falte capacidade para dar valor ou de seres alguma coisa mais parecida com um ser humano.
Podes ter ou não culpa. Não interessa... És assim e não prestas por assim seres. Para ti e para os outros. Esse sofrimento arrastado, corrosivo e rancoroso chega a roçar o doentio... Mas porquê? Aceita as chaves que já te foram entregues no coração, para que possas abrir esse cadeado. É só rodar para a esquerda...